COLUNISTAS – CONHECENDO AS ORIGENS – PUGLIA, BERÇO DA PRIMITIVO

CONHECENDO AS ORIGENS – PUGLIA, BERÇO DA PRIMITIVO

Luiz Horta
mailto:Hortaluizhorta@gmail.com
 
 

 A Puglia, calcanhar e salto da “bota” italiana, é um dos meus lugares favoritos no mundo do vinho. Terra plana e seca, foi dela que saíram muitos dos imigrantes italianos no final do século 19 rumo a São Paulo e ao Paraná. Seu passado histórico é muito rico, recuando ao primeiro milênio a.C. A agricultura é centrada em grãos, azeites e vinho, especialmente o tinto, que responde por mais de 60% da produção vinícola da Puglia.
Durante muitos anos, a Puglia produziu vinhos medíocres, que chegavam a ser enviados em caminhões-tanque para serem (ilegalmente) engarrafados no norte junto com vinhos populares de outras regiões.
Hoje, o cenário é diferente: aproveitando-se de condições climáticas favoráveis, como chuvas no inverno após a colheita, a presença de muitos vinhedos antigos, a boa maturação dos grãos e preços de terras bem mais baixos do que no Norte do país, diversos produtores tradicionais, como a Antinori (que adquiriu 600 há ha de vinhas em 2000), e internacionais, como alguns americanos, estão investindo nessa região.
As uvas autóctones mais difundidas são a Uva di Troia, em Castel Del Monte, a Negroamaro em Salento (especialmente em Salice Salentino), e a minha preferida e motivo de ter escolhido falar da Puglia: a Primitivo.
Sim, boa parte do sucesso dos vinhos varietais produzidos com a Primitivo deve-se à popularidade que sua parente próxima, a Zinfandel, goza no mercado dos EUA. Os californianos juram que a Zinfandel é autóctone do Oeste norte-americano, mas parece que sua origem seria croata. Sabe-se, por exemplo, que o DNA da Primitivo e da Zinfandel é idêntico ao da uva Crljenak Kaštelanski.
Como curiosidade, essa cepa croata foi quase que totalmente destruída durante o ataque da filoxera, e em 2001 restavam apenas nove vinhas dessa uva de nome quase impronunciável na costa da Croácia. Uma professora da Universidade da Califórnia, Carole Meredith, dá a essas uvas como um todo o nome de ZPC (abreviatura de Zinfandel/Primitivo/ Crljenak Kaštelanski).
Seja como for, o estilo dos vinhos feitos à base da Zinfandel e da Primitivo é muito similar, o que gera uma excelente demanda para os vinhos da Puglia nos Estados Unidos. Alguns produtores italianos exploram essa semelhança e colocam nos rótulos de vinhos de Primitivo a palavra Zinfandel, o que é permitido pela legislação italiana.
O nome da Primitivo aparece pela primeira vez na Itália na década de 1870, e deriva da tendência dessa uva a amadurecer antes de outras cepas. Segundo se acredita, a Primitivo teria sido levada à Puglia no século 18 por um padre, Dom Francesco Indellicati.
Os melhores vinhos dessa uva são os Primitivo di Manduria DOC, denominação instituída em outubro de 1974. Abrange as uvas cultivadas nas províncias de Brindisi e Taranto, especialmente em Manduria, Avetrana, Sava, Maruggio Lizzano e Pulsano.
As vinhas já têm certa idade e crescem sem irrigação, o que faz com que sua produção seja baixa e a concentração da fruta mais intensa. A única uva que pode ser empregada na produção desses vinhos é a Primitivo; a gradação alcoólica mínima é de 14%, mas normalmente passa de 15%.
Os vinhos mais característicos feitos com a Primitivo têm coloração intensa, retinta, prenunciando a riqueza de notas ao nariz, com geleia de frutas vermelhas, baunilha, especiarias, tabaco, repetidas na boca. São carnudos e concentrados, com taninos sedosos, excelentes para acompanhar um churrasco, por exemplo.
No Brasil, é possível encontrar diversos vinhos da Puglia com denominação DOC (Primitivo di Manduria), como é o caso dos excelentes blockbusters Lucarelli Old Vines, trazido pela Casa Flora, e Sessantani da World Wine; do Caleo Salento da Interfood, aveludado e harmonioso; do Archidamo da Decanter, com sua bela estrutura tânica e final longo; do macio e frutado Torcicoda da Mistral, produzido pela vinícola da Antinori na Puglia. Conheça a Puglia através dessa musculosa cepa!

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